Tenho notado um crescente interesse por “blindagem” de patrimônio. Particularmente, nunca fui afeita ao termo “blindagem” (apesar de ser amplamente utilizado), pois entendo que não há como “blindar” um patrimônio, mas sim utilizar mecanismos lícitos para organizar e proteger bens, notadamente para fins sucessórios.
A ideia de que esse mecanismo também serve para proteger o patrimônio contra credores é, no mínimo, duvidosa. Quando utilizado de forma abusiva, deixa de ser uma proteção legítima e passa a ser um subterfúgio para fugir de responsabilidades.
Vale destacar que, recentemente, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) reforçou essa perspectiva ao reconhecer a “possibilidade da desconsideração inversa da personalidade jurídica” em um caso que a credora conseguiu provar que o devedor adotou um mecanismo jurídico com a finalidade de ocultar seus bens pessoais.
O STJ reconheceu que “houve uso da empresa recorrida pelos executados para ocultação de seu patrimônio em detrimento dos credores e que a titularidade da pessoa jurídica pelos filhos dos executados só reforça a presunção de que ela é usada para “blindagem” do patrimônio da família, antecipando-se apenas os efeitos da futura sucessão.” (Recurso Especial nº 2095942-PR)
No acórdão, também foi enfatizado o Enunciado n. 283/CJF, segundo o qual “é cabível a desconsideração da personalidade jurídica denominada ‘inversa’ para alcançar bens de sócio que se valeu da pessoa jurídica para ocultar ou desviar bens pessoais, com prejuízo a terceiros”.
Não se trata de demonizar a “blindagem” patrimonial, mas sim entender que não é um escudo infalível. O melhor caminho continua sendo a transparência e o respeito às normas legais, sem recorrer a subterfúgios que, no fim das contas, podem não só falhar em proteger o patrimônio, mas agravar a situação do devedor e prejudicar o planejamento sucessório.
Nady Dequech